NO CORPO

A QUÍMICA DO ALEITAMENTO

 

A amamentação é extremamente importante para o desenvolvimento do bebê. Mas como esse ato pode gerar o forte vínculo hormonal entre mãe e filho?

 

Por Carlos Vinícius Pinto dos Santos

 

Figura 1 - Parte da relação mão-filho tem forte influência hormonal

Foto: Desconhecido, O Mundo da Química não detém direito sobre esta imagem

 

Fábrica de Amor

 

Os níveis de estrogênio e progesterona decaem rapidamente após o parto, permitindo que a prolactina estimule o fluxo de leite materno nos seios. A ocitocina é produzida durante toda a amamentação atuando também na maior oferta de leite materno.

 

Figura 2 - Níveis médios de hormônios durante o processo de geração de vida

Imagem: Desconhecido, O Mundo da Química não detém direito sobre esta imagem

 

Contudo, o principal estímulo é a própria amamentação, cujo efeito é mediado neuronalmente1. Por isso a importância de fazer da amamentação a fonte exclusiva de alimento ao bebê, pelo menos nos primeiros 6 meses.

 

Logo após o parto, um tipo de leite espesso é pronto para ser oferecido ao recém-nascido: colostro. O colostro é um tipo de leite que possui grande quantidade de imunoglobulinas ativas, anticorpos e proteínas protetoras, funcionando como sua primeira vacina, prevenindo de alergias e infecções. Além disso, é a única substância capaz de eliminar os resíduos de mecônio do trato gastrointestinal, ajudando o intestino do bebê a amadurecer e funcionar de maneira eficiente. Ao realizar o adequado controle e equilíbrio das bactérias que se desenvolvem em seu intestino, o colostro evita diarreias. Nas primeiras horas após o parto, o colostro tem sua mais rica composição, decaindo pelos próximos quinze dias e se transformando em leite maduro2.

 

Durante a transformação em leite maduro, o leite é conhecido como leite de transição, também conhecido como descida de leite. Apesar do aspecto “aguado”, contém todos os nutrientes necessários ao bebê e seu fornecimento não deve ser interrompido ou substituído, a menos de orientação médica. Segue abaixo as composições do colostro, leite de transição e leite maduro2:

 

Tabela 1 - Composições químicas de diferentes tipos de leite

 

A análise da tabela acima permite observar importantes informações. Nos macroparâmetros (água, energia, sólidos totais, proteínas e minerais) não há grandes diferenças entre os diferentes tipos de leite estudados, a menos da energia menor fornecida pelo colostro. O leite de vaca tem grande vantagem quando é observada a distribuição de aminoácidos, fornecendo-os em maiores quantidades. Entretanto, o leite materno tem maior qualidade nas gorduras oferecidas, principalmente nas insaturadas e no fornecimento massivo de vitaminas. O leite materno é superior ao de vaca em quase todas as vitaminas estudadas, apenas fornecendo menores quantidades de vitamina E e K, além de não fornecer vitamina B12 (ao menos, não foi identificada neste estudo).

 

Depois de maduro, o leite materno possui dois tipos distintos: o de início e o de fim de mamada, cada um com suas funções e composições específicas.

 

Tabela 2 - Distribuição de nutrientes entre tipos de leite materno

 

O de início é rico em água e tem aparência mais rala. É importante para hidratar o bebê e preparar o trato intestinal para receber o leite de fim, que é rico nas gorduras e outros nutrientes que vão saciar o bebê.

 

Figura 3 - Aspecto do leite materno no início da amamentação (esquerda) e no fim (direita)

Foto: Desconhecido, O Mundo da Química não detém direito sobre esta imagem

 

Cada bebê tem um tempo específico para lidar com os tipos de leite e a transição entre eles, portanto é importante manter o bebê na amamentação o tempo necessário para que esteja satisfeito3.

 

Estabelecendo os Laços Maternais

 

A ocitocina é liberada em quantidades cada vez maiores à medida que o parto se aproxima e, no parto, há grande liberação desse hormônio. Ele também é liberado durante a amamentação, tendo um efeito secundário extremamente importante: está envolvido na formação fisiológica dos laços de amor entre mãe e filho4,5,6.

 

Figura 4 - Estrutura química da ocitocina

Imagem: O Mundo da Química

 

A ocitocina está relacionada à formação dos sentimentos de confiança e fidelidade. Evolutivamente, esse estímulo hormonal ao amor é importante para gerar a necessidade de proteção de seu filho7.

 

O sorriso do filho causa aumento de produção de dopamina na mãe, hormônio associado à sensação de recompensa5. A dopamina, por sua vez, estimula o sistema nervoso central a produzir adrenalina, que está associada a dependências e vícios como drogas, jogos e álcool. O sorriso do seu bebê torna a mãe viciada nele, fazendo o possível para mantê-lo feliz e saudável.

 

Figura 5 - Estrutura química da dopamina

Imagem: O Mundo da Química

 

Quando o bebê ainda está na barriga, ele é capaz de relacionar os hormônios, que recebe através do sangue, com o compartamento da mãe. Assim, se a gravidez for tranquila, ocorrerá maior produção de endorfina, induzindo sensação de bem-estar no bebê6.

 

Figura 6 - Estrutura química da endorfina

Imagem: O Mundo da Química

 

Apesar dos esforços da Bioquímica para compreender os intrincados processos da reprodução humana, ainda há muito que descobrir. Ainda há muita “mágica” em como um humano é ser gerado.

 

Referências

 

1 UFRS - Aleitamento Materno: Aspectos Gerais

2 LAURINDO, V. M.; CALIL, T.; LEONE, C. R.; RAMOS, J. L. A.; Composição nutricional do colostro de mães de recém-nascidos de termo adequados e pequenos para a idade gestacional. II - Composição nutricional do leite humano nos diversos estágios da lactação. Vantagens em relação ao leite de vaca, Revisões e Ensaios - Pediatria - USP, pag. 14-23

3 ATWOOD, C S.; HARTMANN, P. E.; Collection of fore and hind milk from the sow and the changes in milk composition during suckling, Journal of Dairy Research, Vol. 59, pag. 287-298

4 LEE, H.; MACBETH, A. H.; PAGANI, J.; YOUNG, W. S.; Oxytocin: the Great Facilitator of Life, Prog. Neurobiol., Vol. 88, Nº 2, pag. 127–151

5 STRATHEARN, L.; LI, J.; FONAGY, P.; MONTAGUE, P. R.; What’s in a Smile? Maternal Brain Responses to Infant Facial Cues, Pediatrics, Vol. 122, Nº 1, pag. 40–51

6 Ecstatic Birth: The Hormonal Blueprint of Labor 

7 STRATHEARN, L.; FONAGY, P.; AMICO, J.; MONTAGUE, P. R.; Adult Attachment Predicts Maternal Brain and Oxytocin Response to Infant Cues, Neuropsychopharmacology, Vol. 34, pag. 2655–2666

 

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